O mundo divide-se em dois tipos de líderes:
»» Aqueles que andam a contabilizar o impacto de cada cêntimo das eventuais ajudas de custo que poderão vir a ter que pagar aos colaboradores em teletrabalho, devido às despesas de eletricidade, água e internet;
»» Aqueles que compreendem que os seus colaboradores não são um peso financeiro, mas sim os seus maiores aliados.
Não quero com isso dizer que o planeamento financeiro seja negligenciável. Mas o debate a que temos assistido no mundo empresarial, que transpôs-se para a esfera política, primeiro em sede de concertação social e mais recentemente no parlamento, só veio demonstrar que os nossos gestores precisam trabalhar mais a sua visão de longo prazo.
Em primeiro lugar, importa relembrar que a experiência que vivemos no último ano, não pode ser chamada de teletrabalho. Confinar os colaboradores em casa, muitos sem preparação prévia (e muitos com crianças pequenas em casa), está longe de ser uma referência para qualquer modelo de trabalho.
Em segundo lugar, no momento atual que vivemos, a segurança dos colaboradores deve continuar a ser uma prioridade. Há que considerar que não basta haver distanciamento dentro das instalações: O regresso ao escritório implica reaprender uma rotina, voltar aos transportes públicos, superar medos e ansiedades.
O futuro do teletrabalho merece uma reflexão cuidada, que não pode ser resumida a uma coluna de Excel
O futuro do teletrabalho merece uma reflexão cuidada, que não pode ser resumida a uma coluna de Excel. Os gestores devem considerar não só os custos inerentes à deslocalização do trabalho. Devem estar atentos a fatores como produtividade e saúde mental:
– Atração e retenção de talento: Uma maior abrangência geográfica para recrutamento de talento. Políticas mais flexíveis são mais atrativas e cada vez mais os colaboradores estão atentos ao TCP (total compensation package) e não só ao salário.
– Qualidade de vida: O teletrabalho permite, sem dúvida, uma melhor conciliação da vida familiar, com menos tempo (e dinheiro) gasto diariamente em deslocações.
– Mais produtividade: Se olharmos para as empresas de referência em produtividade por colaborador, todas têm no seu ADN um modelo de trabalho flexível e que valoriza o cumprimento de objetivos, em detrimento a um modelo em que o que importa é o número de horas que o colaborador está no escritório.
– Saúde mental: Desde que haja uma separação adequada dos momentos de trabalho e dos momentos de lazer, o teletrabalho pode contribuir para uma vida mais equilibrada.
Contudo, nem tudo são vantagens. O teletrabalho, principalmente a experiência recente que vivemos, trouxe-nos muitas preocupações:
– Inexistência de barreiras entre a vida pessoal e a vida familiar: E-mails e grupos de WhatsAPP com mensagens 24 horas, 7 dias por semana;
– Reuniões intermináveis via Zoom / Teams (muitas das quais poderiam ser um email);
– Aumento dos casos de depressão e ansiedade. Não é possível quantificar quantos destes casos estão relacionados com o teletrabalho. Encontra-se em estudo a associação entre o teletrabalho e o sentimento de isolamento social, principalmente em indivíduos com pré-disposição para a depressão;
– Dificuldade na integração de novos recursos;
– Como potenciar a criatividade da equipa e incentivar a colaboração entre as equipas;
– Como disseminar a cultura organizacional da empresa e fomentar o espírito de equipa;
Muitos dos problemas de produtividade e gestão das equipas…já existiam nos modelos tradicionais de trabalho presencial
Muitos dos problemas de produtividade e gestão das equipas que são imputados ao teletrabalho já existiam nos modelos tradicionais de trabalho presencial. São problemas que, em última análise, estão relacionados com a liderança.
Agora, mais do que nunca, é hora de pararmos de nos preocuparmos só com os cêntimos. Os próximos anos requerem resiliência e foco no que é importante. Não há empresas sem pessoas.