O Paradoxo dos Soft Skills

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Nos dias que correm já ninguém tem dúvidas nos impactos que a automatização avançada está a trazer para os conceitos do trabalho como o conhecemos. E falo de tudo o que se fala por estes dias: robots para tarefas estritamente manuais, machine learning, inteligência artificial com capacidades cognitivas e até equipas mistas homem-máquina).

E não é fácil estabelecer quais a fronteira entre o que é estritamente do domínio humano e quais as tarefas automatizaveis. No entanto, e nesta altura, parece que existe já alguma unanimidade no que não pode ser substituido por máquinas: o toque humano da criatividade, a habilidade manual de algumas profissões e a capacidade humana de interpretar estados e emoções. Especialmente as mais complexas.

“Então o caminho é dotar os humanos com o máximo de soft skills que seja possível.”

Eis que ganha especial importância os bem humanos “soft skills”. Esses skills são tidos como irreplicáveis, por enquanto e num futuro próximo, pelas máquinas. São bem humanos. Estamos a falar de skills humanos como a empatia, a contextualização sensorial, a colaboração, o pensamento criativo, a socialização, a resiliência e criação de relacionamentos baseados na confiança.Então o caminho é dotar os humanos com o máximo de soft skills que seja possível. E os contact centers, porque grande parte das suas atuais funções é automatizável, não escapam desse caminho. A tendência que mais se ouve e lê é que se deve automatizar tudo o que é transacional e libertar os profissionais para as tarefas onde acrescentem valor pelas necessidade de análise complexa, de criatividade, interpretação emocional e relação humana. Onde se evidenciam os soft skills!

O grande problema é que estamos perante um enorme paradoxo: queremos soft skills mas temos as nossas organizações organizadas para dificultar os soft skills. E os contact centers são, na sua generalidade, exemplo disso.

Para começar tudo se parece com uma fábrica. Desde os processos de formação (ainda com fundações na Revolução Industrial – pessoas em grupos fechados em salas, seguindo conteúdos formatados e regras bem delineadas) até aos próprios ambientes de trabalho onde se juntam largos números de profissionais executando as mesmas tarefas de forma organizada e repetitiva, seguindo padrões de atuação e de comportamento. Há falhas na orientação para os sentimentos e interpretação das pessoas e do que as faz procurar ajuda. Não deixa de ser irónico que esses contact centers tipo fábrica representam o tipo de atividade nas quais as máquinas e a automatização são extremamente competentes. Fácil operarem sem pessoas. É uma questão de tempo.

Para agravar carregamos tudo com tecnologia. Tudo nos contact centers é suportado em tecnologia. Na nossa vida estamos já imersos em videogames, redes sociais e assistentes virtuais. Já temos tudo isso nos nossos contact centers (gamification, professional social networks e knowledge base avançadas). E é certo e sabido que o uso intensivo de tecnologia afeta o desenvolvimento dos soft skills.

Para rematar carregamos no stress. Nos contact centers temos profissionais que aprendem tudo e mais alguma coisa de forma intensiva. Mas os estudos demonstram que o stress é um enorme inimigo do desenvolvimento de soft skills. Quem consegue desenvolver empatia, criatividade e colaboração debaixo de enorme e permanente stress? Por natureza a pressão traz ao de cima o nosso instinto de sobrevivência, os nossos hard skills.

O caminho não é fácil. E o paradoxo apontado atrás pode ser combatido por ações nas mesmas dimensões:

Podemos formar com menos powerpoints em salas fechadas. Temos exemplos de processos formativos suportados na empatia, colaboração e desmateralização. Podemos utilizar tecnologia orientada para o desenvolvimento de soft skills e existem inovações tecnológicas para reduzir o stress no trabalho.

Mas se queremos manter e realçar o que humano no tempo das máquinas temos de nos focar no que é humano. Há muitos exemplos e muitas práticas provadas. Com base em muita criatividade. Mas falta dar-lhes escala para obtermos ainda mais distinção humana.